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segunda-feira, 14 de maio de 2012

Minhas Tardes com Margueritte (2010)

La Tête en Friche
Direção: Jean Becker
Elenco: Gerard Depardieu, Giséle Casadesus, Patrick Bouchitey, Sophie Guillemin
Escrito por: Jean Becker e Jean-Loup Dabadie, baseado em livro de Marie-Sabine Roger
França, 2010
Nota no IMdB: 7.1



"Minhas Tardes com Margueritte" explora a descoberta do prazer pela leitura. Sobretudo, procura demonstrar que sempre há tempo para aprender ou se deixar cativar por estórias contidas nos livros. Ainda mais se o contexto da obra puder ser reconhecido no cotidiano do leitor.



Gerard Depardieu é Germain, que se acostumou, desde pequeno, a se maltratado pela mãe e por professores em público. Com pouca educação formal, mora em um trailer no quintal da casa da mãe e vive de bicos, como verdureiro ou ajudante de um bar. No bar onde seus amigos se reúnem todas as tardes, o espectador conhece integrantes de uma classe média baixa francesa que passam boa parte do filme entretidos com bebidas e jogos de cartas, dados e dardos.




Margueritte (Casadesus) é uma senhora culta, aposentada da Organização Mundial de Saúde (OMS) que conhece Germain em um banco de parque. O cuidado dele ao alimentar os pombos atrai a adorável senhora, que aos poucos passa a ler para ele clássicos da literatura francesa. 



É notável a reação ao primeiro contato com Albert Camus, assim como a perplexidade ao descobrir a função de um dicionário - "onde há palavras demais, faltam outras". Assim como faltam palavras aos amigos quando Germain passa a usar no bar as comparações aprendidas com Margueritte. 



Como valores aprendidos sem necessariamente uma educação formal - ou culta, Germain conserva um senso de atenção e ingenuidade ante os acontecimentos. Se "um bom leitor é um bom ouvinte", como defende Margueritte ao se deparar com um homem que mal sabe ler mas discute com abstração as histórias que ouve, há vários caminhos para a descoberta. Assim como Germain aprendeu a entalhar em madeira pombos como os que alimenta diariamente no parque. 



O diretor Jean Becker construiu uma fábula com intensa significação, editada no ritmo acelerado dos modos de seus personagens nada aristocráticos. "Minhas Tardes com Margueritte", que recebeu menos atenção da crítica e das salas de cinema do que deveria e chegou com dois anos de atraso ao circuito brasileiro, se insere na boa coletânea de filmes sobre amizade na velhice, que merecem ser revistos de tempos em tempos - de "Conduzindo Miss Daisy" a "Elza y Fred" e "Depois Daquele Baile" - para lembrar que o cinema ainda carrega partículas de esperança e redenção. 



segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

O garoto da bicicleta (2011)

O garoto da bicicleta (Le gamin au vélo) 
Direção: Jean-Pierre Dardenne, Luc Dardenne 
Elenco: Thomas Doret, Cécile de France, Jerémie Lenier
Escrito por: Jean Pierre Dardenne, Luc Dardenne 
França, 2011
Nota no IMdB: 7.6






Um ritmo de filmagem e diálogos mais ágeis que os esperados para um drama familiar francês. Assim se desenvolve "O garoto da bicicleta" (Le gamin au vélo) dos irmãos Luc e Jean-Pierre Dardenne, em cartaz em salas mais modestas. Sem melodramas e com ritmo suave, cativa por abordar o tema do abandono com sobriedade. 






Aos 12 anos, Cyril Catoul (Thomas Doret) foi deixado pelo pai em um internato e, aos poucos, se dá conta de que Guy Catoul (Jérémie Renier) não vai voltar para buscá-lo. Após tentativas de fuga para encontrar o pai, o garoto descobre que sua bicicleta fora vendida e que o endereço onde espera retomar a vida está vazio.






Numa situação fortuita, conhece Samantha (Cécile de France), cabeleireira , que encontra a bicicleta na vizinhança, consegue comprá-la e a devolve para Cyril. É o início de uma relação de (des) confiança e esperança entre os dois. 






Samantha tenta atrair a atenção do garoto, que alterna momentos de carinho e rebeldia, em reações involuntárias de demonstrar carência pela falta paterna. Quando fica mais claro ainda o desprezo de Guy, ela assume a responsabilidade de lidar com a imprudência juvenil e a construção da confiança.






O traficante do bairro parece atrair mais facilmente a atenção de Cyril, com a facilidade dos jogos eletrônicos e da adrenalina. Mas, ocupar o lugar da ausência do pai do garoto é tarefa mais complicada, que os irmãos Dardenne preferem abordar sem uma falsa facilidade. A camisa vermelha, frequentemente usada por Cyril, é uma metáfora para a falta de cuidado, ou ainda para uma personalidade que busca meios de construção. 






"O garoto da bicicleta" apresenta ao menos dois problemas. O carinho de Samantha por Cyril parece quase gratuito, mesmo com toda a rebeldia do garoto. E, principalmente: o pai, mesmo empregado, prefere largar o filho. Desconheço a lei francesa, mas deve haver alguma proteção para o menor em caso de abandono. Como foi apresentado, talvez tenha sido uma conexão rasteira no roteiro.  



quinta-feira, 21 de abril de 2011

O Concerto (Le Concert)

O Concerto (Le Concert) 
Direção: Radu Mihaileanu
Elenco: Mélanie Laurent, Alexeï Guskov, Dmitri Nazarov, François Berléand
Escrito por: Radu Mihaileanu, Héctor Cabello Reis, Thierry Degrandi, Mathew Robins, Alain-Michel Blanc
França, Bélgica, Rússia, Itália, Romênia, 2009
Nota no IMdB: 7.5




A obsessão de um maestro pela execução perfeita do Concerto para Violino em Ré Maior (op.35), de Tchaikovsky. Eis o ponto crucial de "O Concerto" (Le Concert), que envolve franceses e russos em camadas de comédia e drama ao focalizar a Orquestra Bolshoi nos anos 80 - portanto, antes da queda da URSS - e o reencontro de músicos com os palcos após décadas ausentes por motivos políticos. 


Andreï Filipov (Alexeï Guskov) é 'o maestro', lenda viva da regência que foi obrigado a abandonar os palcos pela política do ex-presidente soviético Brejnev, por ter mantido músicos judeus na Orquestra 30 anos antes. Longe das apresentações, Filipov trabalha na limpeza da Orquestra, até que um fax cai em suas mãos: um convite para levar o Bolshoi a Paris. Em poucos dias, o 'maestro' deve reunir na surdina fenômenos da música, distantes há décadas dos palcos, para a execução da peça que o persegue há anos. Fatos reais do declínio da URSS encravados em ficções condizentes com o momento histórico, em uma narrativa que não se contradiz e se desenvolve.






Para a apresentação, o 'maestro' exige a presença da solista de renome internacional Anne-Marie Jacquet (Mélanie Laurent), spalla - o violino principal de uma orquestra - que interpreta cenas de maior tensão: os encontros pré-concerto e as implicações entre passado/futuro da própria vida. A violinista também convive com o tabu em relação à execução de Tchaikovsky e com a busca do arrebatamento e da harmonia que acometem grandes momentos de inspiração



Estereótipos à parte, o comportamento dos russos em Paris garante boa diversão, numa co-produção europeia independente, com condução apurada e leve do diretor, sem perder a complexidade do contexto político nem simplificá-lo no universo do filme. Tons sóbrios sustentam a direção de fotografia, com destaque para tons de cinza, sem no entanto criar uma atmosfera sombria. Construído linearmente, "O Concerto" faz uso de efeitos embaçados em flashbacks quando remete ao passado, como quando Filipov relembra o concerto derradeiro que significou sua aposentadoria precoce dos palcos. Com fusões de imagens e flashes, dá a conhecer o futuro dos personagens em breves intervalos da linearidade. 




A busca incessante pelo arrebatamento por que passa o ser em contato com a música é o centro do filme. Universal, além de qualquer contexto político, o sentimento aguçado pelo som e provocado pela necessidade de abstração que têm o homem move músicos virtuosos e o ouvinte comum e ultrapassa qualquer tentativa de explicação. Como justifica a certa altura Filipov: "A orquestra é um mundo. Cada um contribuindo com seus próprios instrumentos, seu talento. Pelo tempo de um concerto estamos todos unidos e tocamos na esperança de chegar a um som mágico: a harmonia". 


"O Concerto" foi finalizado em 2009 e só agora chega em Belo Horizonte, onde é exibido em apenas uma sala, em um horário somente, no meio da tarde. Pouca visibilidade para o filme que provavelmente seja o mais interessante em cartaz na cidade. 


Teve vontade de ouvir os atrativos do Concerto para Violino em Ré Maior (op.35) de Tchaikovsky? Permita-se ser conduzido.