segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Operação Presente (2011)

Operação Presente (Arthur Christmas)
Direção: Sarah Smith
Vozes: James McAvoy, Hugh Laurie, Bill Nighty, Jim Broadbent, Imelda Stauton
Escrito por: Sarah Smith, Peter Baynham
EUA, 2011
Nota no IMdB: 7.2



O filão de filmes natalinos - quase sempre voltados para questões comerciais e ausentes do significado cristão, razão da data - a cada ano se repete para alcançar o público infantil.

Mas, eis que a animação "Operação Presente", do estúdio inglês Aardman e da Sony em 2011 consegue agradar sem subestimar a inteligência infantil. O enredo tem recursos ao enfocar a família do Papai Noel e a dificuldade para entregar todos os presentes do mundo em uma noite de dezembro.




"Operação Presente", da diretora Sarah Smith, não trata sobre a recorrente dúvida da existência do velhinho; em tempos de internet, as crianças se preocupam mais em procurar sua casa no Google Earth e questionar a logística para que todos recebam seus pedidos na noite de natal. Apesar disso (ainda bem!), ainda escrevem cartas e não emails para o Pólo Norte. 





O clássico sistema de um senhor altruísta, guiado em um trenó por renas voadoras é substituído, com muita ironia, por um analista de riscos e eficiência, em trajes militares. O primogênito de Noel comanda a equipe de elfos especialistas responsáveis pela entrega dos presentes a partir de uma nave baseada no Pólo Norte. O novo Noel - sem barba, musculoso e com cabelos curtos - é filho e neto dos últimos Noeis da velha guarda da estirpe, num paradoxo sobre o choque de gerações.



Nem tudo está perdido: o caçula do Papai Noel, Arthur, garoto estabanado e pouco querido nesta lógica racional, é um dos poucos que ainda acredita no Natal como "magia" infantil e respeita a inocência dos pedidos contidos nas cartinhas. Arthur se aproveita de um presente esquecido - o software também erra - para resgatar a nostalgia do avô e enfrentar - com bom humor - as próprias inseguranças.


Com um brasileiro na equipe de animadores (Claudio Oliveira, que também trabalhou em "Watchmen" e "Tá chovendo hambúrguer), "Operação Presente" traz rigorosa qualidade de produção, efeitos relevantes na exibição em 3D e uma história leve, sem melodramas e com argumento sustentado em 1h37 de projeção.




quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Os 3 (2011)

Os 3
Direção: Nando Olival
Elenco: Juliana Schalch, Gabriel Godoy, Victor Mendes, Sofia Reis, Rafael Maia
Escrito por: Nando Olival, Thiago Dottori
Brasil, 2011
Nota no IMdB: 6.0 




As primeiras cenas de "Os 3" não ajudam muito. Três jovens, saídos de partes diferentes do país, se conhecem na primeira festa da faculdade, se tornam amigos inseparáveis no curso de jornalismo e no final você sabe que vão participar de um reality show sobre as próprias vidas, no próprio apartamento alugado. Ainda por cima, um pretende ser escritor e a garota tem vontade de ser atriz. Mais clichê, impossível.




Mas Nando Olival, publicitário que se arriscou nos cinemas há 10 anos com Walter Sales em "Domésticas - o filme", consegue construir uma história despretensiosa sobre alguma falta de perspectiva juvenil que acaba funcionando. Não se sabe como a amizade entre os três - Juliana Schalch, Gabriel Godoy e Victor Mendes nos papéis de Camila, Cazé e Rafael, respectivamente - de fato começou, mas as cenas no "apartamento" compartilhado dá boas ideias. A amizade se dilata em um triângulo amoroso que é apresentado sem pudores, mas sem chocar. 



Um trabalho no fim do curso motiva um produtor a propô-los filmar as próprias vidas em troca de anúncios publicitários "espontâneos". A ideia é espalhar produtos pela casa que, no teatrinho da vida real mostrado pela web, vão ser adquiridos pelos espectadores. Nesse momento a ingenuidade do filme se transforma na grande sacada do roteirista/diretor: o aspirante a escritor pode desenvolver tramas para fingir a própria vida, a aspirante a atriz pode fingir ser ela mesma como outra pessoa.



A partir daí, tudo que acontece pode ser um acontecimento espontâneo ou uma trama que pega algum deles próprios de surpresa. O impulso pelo desejo também é abordado, e nesse momento o filme deixa claro demais desde o princípio algumas aparentes contradições - quem assistir pode ter essa mesma noção.



Um filme brasileiro independente, em cartaz no circuito comercial em salas de shoppings, surpreende. "Os 3" não é um filme imperdível e podia ser melhor em diversos aspectos da trama. Mas convence e é bem trabalhado esteticamente com a direção de arte de Clô Azevedo. 


sábado, 17 de setembro de 2011

Larry Crowne - O Amor Está de Volta (2011)

Larry Crowne 
Direção: Tom Hanks
Elenco: Tom Hanks, Julia Roberts, Sarah Mahoney, Pan Grier
Escrito por: Tom Hanks, Nia Vardalos
EUA, 2011
Nota no IMdB: 6.0 



A crise econômica afetou a classe média americana a ponto do tema ser parte do cotidiano dos personagens de filmes sem causar espanto. Tom Hanks - de volta à direção desde "The Wonders - O Sonho Não Acabou" (1996) - dá vida ao pacato Larry Crowne, vendedor de uma rede de departamentos que é demitido após anos de serviço e retorna aos estudos para pagar as dívidas. Não ter cursado faculdade foi a justificativa do empregador, mas o filme responde com sutileza que a questão é mais ampla e afeta de modo dramático a população. 



Bolha imobiliária, hipotecas insolventes, a moto que deixa o SUV parado na garagem, o desencantamento da professora por causa do desinteresse dos alunos, o retorno às salas de aula após décadas sem estudo - muitos elementos da nova cara dos EUA estão presentes em "Larry Crowne" (2011), mas Hanks não se esqueceu que esta é uma comédia romântica. Sabe dosar o pano de fundo para não confundir o enredo e constroi uma história de beleza e simplicidade, com uma estética inspirada em produções do começo dos anos 90. 



Tom Hanks também é co-roteirista, com Nia Vardalos - de Casamento Grego (2002)- e apresenta personagens marcantes:  Crowne e Mercedes Tainot (uma Julia Roberts inspirada no papel da professora desencantada com a educação contemporânea e a decrescente influência exercida pelo magistério). Não serão inesquecíveis como Forrest Gump ou Erin Brockovich, mas cativam pela simplicidade, pelo humor afiado e pela sintonia quando contracenam.



Nas contradições da vida, um discurso bem funamentado fortalece os argumentos, e é curioso perceber como a mulher com problemas de comunicação é a eficiente professora de oratória que, enfim, redescobre poder cativar os alunos. As histórias de viagem do ex-marinheiro, por outro lado, formam o contraste entre o pé no freio dos tempos atuais  e a imensidão da descoberta do mundo. Menção honrosa para a 'gangue' de motos de Frances (Pan Grier).


quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Trilha Sonora do Dia (Dia I) - Amor a Toda Prova

Crazy, Stupid Love
Direção: Glen Ficarra, John Requa
Elenco: Steve Carrel, Juliane Moore, Ryan Gosling, Emma Stone, Marisa Tomei, Kevin Bacon
Escrito por: Dan Fogelman
EUA, 2011
Nota no IMDb: 7,9



Alguns filmes merecem mais atenção pela trilha sonora que propriamente pela história. "Amor a Toda Prova" é mais uma comédia romântica tipicamente americana que traz no elenco atores em voga no mercado para atrair o público. Um filme sobre como os homens estão disponíveis para a conquista mas pouco preparados para lidar com o amor. 

Cal (Steve Carrel) casou-se com a primeira namorada, Emily (Juliane Moore) e não sabe se relacionar com outras mulheres 25 depois, quando a esposa pede-lhe o divórcio. Cal recebe a ajuda de Jacob (Ryan Gosling), uma espécie de guru do amor bem picareta. Há ainda a trama paralela do filho apaixonado pela babá, que prefere dar atenção para homens mais velhos. A trama de "Amor a Toda Prova" funciona porque é bastante possível na realidade, e guarda boas surpresas ao final, quando os personagens percebem como suas vidas estão intrincadas. Um filme leve, que diverte sem rebaixar o bom senso do espectador.






A boa notícia vai para a trilha sonora. Começando com o remix de Black is the Color of my True Love’s Hair, na voz de Nina Simone:




Em seguida, temos o The Acorn, banda indie folk de Ontario, Canadá. Esta música chama-se Almanac.




Mark Ronson, produtor de Amy Winehouse, Robbie Williams, Macy Gray, Kaiser Chiefs e Adelle, entre outros, assina o remix da faixa Animal, um ska com levada setentista do Miike Snow, banda indie pop sueca. 




Para manter a pegada funky/ska, temos o Bamboos, big band australiana, que assina On The Sly.



Doris Troy, cantora de R&B dos anos 1960, aparece na trilha com seu maior sucesso: Just One Look, que figurou entre as 10 mais da Billboard em 63. 






I Need Your Love – Marilin Medina, Martin Medina & Jason Ruder, é a faixa-mistério da trilha.  Tente descobrir algo sobre eles, eu não consegui. Tem um clima ambient/lounge que funciona. 




A Austrália também é o berço do The Middle East, outra banda indie folk que atrai atenções em "Amor a Toda Prova". O grupo assina a faixa Blood, que fecha a trilha sonora do filme em clima redentor. 


quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Depois Daquele Baile (2005)

Depois Daquele Baile
Direção: Roberto Bontempo
Elenco: Lima Duarte, Marcos Caruso, Irene Ravache, Ingrid Guimarães, Chico Pelúcio
Escrito por: Rogério Falabella, Susana Schild
Brasil, 2005
Nota no IMdB: 6,7



A estreia do ator Roberto Bontempo como diretor dificilmente seria mais bem aproveitada do que em "Depois Daquele Baile (2005)". Um filme discreto, afetuoso, sobre delicadezas do cotidiano e a força do sentimento latente que só aguarda uma fagulha para transbordar. Uma história sobre o amor na velhice, quando as lembranças de romances já se distanciam e as limitações do corpo passam a receber mais atenção.



Lima Duarte, Irene Ravache e Marcos Caruso alimentam a curiosidade de quem assiste para revelar sem pressa o que os une. Uma amizade franca, consolidada com o tempo e o frescor da descoberta que se reinventa a cada dia. Uma nova forma de enxergar quem está a sua volta. Caruso (Otávio) é cruzeirense e Lima Duarte (Freitas) americano, e as disputas no futebol trazem elementos de humor à trama.



Filmado em Belo Horizonte, atrai o olhar do morador da cidade para lugares habituais - a Praça da Liberdade, a Pampulha, casarões - e do que não conhece a cidade para locações incomuns no cinema nacional. O tributo do diretor à cultura mineira não para por aí: a culinária local está presente desde a primeira cena e a trilha sonora revisita clássicos de Milton Nascimento, Lô Borges e 14 Bis. Um filme sincero e despretensioso, com atuação forte dos três ótimos protagonistas. Uma das melhores produções da recente safra do cinema brasileiro, que merece ser apreciada pelo espectador em 108 minutos bem tomados. 




segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Assalto ao Banco Central (2011)


Assalto ao Banco Central
Direção: Marcos Paulo
Elenco: Eriberto Leão, Milhem Cortaz, Lima Duarte, Hermila Guedes, Giulia Gam, Tonico Pereira
Escrito por: Rene Belmonte, Lucio Manfredi
Brasil, 2011
Nota no IMdB: 5.4



O maior roubo a banco da história do país - e 2º maior do mundo - chega aos cinemas pelas mãos do diretor estreante Marcos Paulo (veterano em novelas).  Entre 6 e 7 de agosto de 2005, mais de R$ 164 milhões foram roubados do cofre do Banco Central em Fortaleza/CE sem o disparo de um único tiro, em ação de extrema ousadia que até hoje não foi devidamente desvendada. Com a construção de um túnel de 78 metros, conhecimentos profundos em engenharia e da rotina do banco, foram retiradas toneladas de notas de R$ 50 usadas. A Polícia Federal estima que 123 pessoas participaram do golpe, sendo 36 de forma direta, mas até hoje pouco mais de 20 foram condenados, 11 absolvidos, 65 aguardam julgamento e há foragidos. Em julho, a polícia diz ter prendido o mentor do golpe, seis anos após a ação. Apenas R$ 50 milhões foram recuperados - R$ 20 milhões em espécie e o restante em bens comprados bem acima do valor de mercado - o que inviabiliza reaver o montante. 




O elenco é quase todo conhecido de novelas da Globo, mas a construção dos protagonistas afasta-os da sombra dos personagens da TV. Eriberto Leão, Milhem Cortaz (estigmatizado pela malandragem após Tropa de Elite), Lima Duarte, Hermila Guedes (sempre lembrada por "O Céu de Suely") e Giulia Gam estão entre os conhecidos e poderiam ter momentos mais inspirados se vários diálogos não tentassem criar bordões - frases que soam forçadas e atrapalham os atores. 



Como o desfecho já é sabido pelo público, a montagem preferiu o uso de elipses para fugir da linearidade na edição do material. Desde o princípio, intercalam-se momentos do recrutamento do bando e da escavação do túnel com a prisão de alguns integrantes. O que prejudica a construção de tensões com alguns personagens, mas que cria uma sinceridade na narrativa e a afasta de uma estética excessivamente marcada  em novelas - o que seria um erro compreensível por se tratar de um diretor veterano na TV. 



Fica a impressão de que haverá uma sequência para o filme, talvez quando a investigação policial trouxer elementos suficientes para alimentar a ficção - não que uma possível continuação seja necessária. Livremente inspirado no caso, Assalto ao Banco Central não segue fielmente os acontecimentos do crime e o destino dos envolvidos, mas deixará respostas em branco se parar por aqui. Ou melhor, o final poderia ter sido diferente, para que essa história parasse por aqui. 



quinta-feira, 28 de julho de 2011

Cilada.com (2011)

Cilada.com 
Direção: José Alvarenga Jr.
Elenco: Bruno Mazzeo, Fernanda Paes Leme, Carol Castro, Sérgio Loroza
Escrito por: Bruno Mazzeo, Rosana Ferrão
Brasil, 2011
Nota no ImDB: 7.3




Stand ups desmoralizaram shows de humor. A novidade deu lugar à saturação e hoje no Brasil qualquer um que se ache engraçado sobe de cara limpa num palco para tentar fazer graça. Situação análoga vive o humor no cinema nacional. Um seriado faz sucesso na TV e vira filme. E gera continuações. E, em geral, o filme não é tão engraçado porque parece apenas um episódio extendido.




É o caso de Cilada.com (2011). Assim como na tv, é protagonizado por Bruno Mazzeo. É mais um caso de trailer mais engraçado que o filme em si. O argumento funciona - Mazzeo cai em roubadas o tempo todo e sabe lidar com bom humor nessas situações. Mas as escolhas do roteiro são falhas e o que se desenrola na tela são situações desagradáveis. Usa-se o sexo para rir do pudor do outro, na típica situação que não teria a mínima graça se acontecesse com você. Há associações com drogas para tentar provar que a história não é careta. E há o clássico desrespeito à empregada doméstica e à prostituta que falam errado. 





Fernanda (Fernanda Paes Leme) é a namorada traída que, para se vingar do ex, divulga na internet um vídeo em que ele tem uma ejaculação precoce. Chacota no serviço, entre os amigos, entre desconhecidos na rua e até num programa de TV, Mazzeo podia viver uma comédia autêntica se os diálogos fossem mais bem trabalhados. As situações até ajudam - o filme que ele planeja para salvar a reputação perante os colegas, a carreira publicitária arruinada pela falta de criativdade - mas falta história, faltam diálogos, falta convencer. Mazzeo é corroteirista - deve realmente ter achado que o filme convenceria.





Filmes associados à Globo Filmes - em geral - dão a impressão de que foram gravados dentro de um shopping, tamanha a 'limpeza' criada nas cenas. A locação pode ser um quarto de classe média, uma favela, uma escola abandonada. A estética do lugar não vai ser muito diferente de uma loja com ar condicionado e luz artificial. Algumas novelas insistem em não sair do Leblon e criam caricaturas do 'resto' do mundo. Infelizmente, essa mania se consolida no cinema nacional e empobrece esteticamente os filmes. Os bons roteiros têm a liberdade narrativa podada e a direção de arte se resume à decoração de interiores. Não por acaso, são as produções com mais recursos financeiros e mais salas disponíveis pelo Brasil - a democratização do cinema no interior do país esbarra na novelização das películas. Uma pena. 95 minutos que poderiam ser resumidos em 20, transmitidos na tv a cabo e substituído na semana seguinte por outro episódio, mais inspirado. Grande cilada.



domingo, 17 de julho de 2011

Cisne Negro (2010)

Cisne Negro (Black Swan)
Direção: Darren Aronofsky
Elenco: Natalie Portman, Mila Kunis, Vincent Cassel, Winona Rider
Escrito por: Mark Heyman, Andres Heinz e John McLaughlin
EUA, 2010
Nota no IMDb: 8.3



O limite entre delírio, ficção, realidade e verossimilhança. O balé do "Lago dos Cisnes", de Tchaikovsky, é o condutor da história de Nina (Natalie Portman) - em atuação consagrada pelo Oscar de Melhor Atriz em 2011, uma bailarina acossada por medos e pressões. Nina divide-se entre os ensaios exaustivos na companhia e a sufocante presença da mãe, ex-bailarina que intromete-se de todas as formas na intimidade da filha. A chance de se tornar a solista da companhia, justamente na montagem do "Lago dos Cisnes", desencadeia conflitos na personalidade de Nina, que associa trechos da própria história aos acontecimentos do texto de Tchaikovsky.


Na história, uma mulher é aprisionada no corpo de um cisne branco, análogo à leveza e à pureza, e precisa do amor de um príncipe para libertar-se deste corpo. Mas a irmã gêmea, retida no corpo de um cisne negro - representando a agressividade e o destempero, ganha o amor do príncipe. O cisne branco, dominado na competição pelo desespero e entregue à inveja da irmã, escolhe a fuga para libertar a alma pura do corpo corrompido.



Nina é sensível, moderada e dedica todo o tempo aos ensaios. Reconhecida pela leveza e perfeito controle dos movimentos, vive ela própria um cisne branco, um desejo contido em uma figura domesticada. Desafiada a encarnar ambos personagens, precisa descobrir as próprias vontades escondidas para entregar-se à performance do cisne negro. Quando isso acontece, desencadeia sentimentos e posturas que não sabia possuir.



Somando-se a isto, Nina enfrenta um quadro de ansiedade - refletido no hábito de coçar as costas a ponto de machucar-se - que desencadeia sensações de perseguição. No metrô, não raro, acredita estar sob olhares amedrontadores. Quando perde o controle sobre o raciocínio, enxerga figuras do balé distorcidas e pensa ser atacada. Vive em sonhos os desejos contidos no cotidiano e confunde esta libertação imaginada com a própria vida. Em última instância, já não distingue sonho, desejo e realidade. Personagens duais fundem-se em sua própria dualidade, e na perda do contato com o real, os ensaios são o único fio que ainda a ligam à razão. 



Dirigido por Darren Aronofsky (de "Réquiem para um Sonho" (2000) e "O Lutador" (2008)), Cisne Negro emocionou plateias no mundo todo ao revelar o paradoxo entre leveza e agressividade de um balé clássico. Uma história fartamente conhecida por gerações, já tratada em diversos matizes, ganha uma montagem exuberante ao trazer para o centro temas sempre presentes, mas por vezes coadjuvantes. Valeu o Oscar de Natalie Portman, pela suavidade/agressividade dos movimentos e olhar nunca tranquilo.


terça-feira, 28 de junho de 2011

Meia Noite em Paris (2011)


Meia Noite em Paris (Midnight in Paris)
Direção: Woody Allen
Elenco: Owen Wilson, Rachel Adams, Kathy Bates, Marion Cotilard, Carla Bruni
Escrito por: Woody Allen
EUA, 2011
Nota no IMDb: 8.1






"Meia Noite em Paris" (2011) traz um Woody Allen inspirado no roteiro e na direção, sem qualquer participação em frente às câmeras. Owen Wilson é Gil Pender, roteirista de sucesso que não consegue êxito ao escrever literatura. Ele está prestes a se casar com Inez (Rachel McAdams) e a viagem do casal a Paris subitamente o inspira, ao experimentar situações que o levam ao sentido de sua escrita e à visão de mundo romantizada do passado que o acompanha.





Com bilheterias em torno dos U$ 25 milhões, já está entre os três mais assistidos da carreira do diretor - junto de Match Point (2005) e Vicky, Cristina, Barcelona (2008), comprovando o interesse que o cinema de Allen ainda desperta. Estima-se que as cifras superem os U$ 40 milhões de "Hannah e suas Irmãs" (1986), o mais assistido de sua filmografia até hoje. 





O próprio Allen parrece ter se cansado do arquétipo de anti-heroi que costumava protagonizar e passou a direcionar as lentes para outros olhares e menos para o próprio ego. Após algumas bolas-fora nos anos 90 e 2000 - como Os Trapaceiros (2000), Igual a Tudo na Vida (2003) e Melinda e Melinda (2005), Allen conseguiu renovar seu cinema ao permanecer atrás das câmeras e trocar abstrações existenciais porconflitos clássicos - apoiado em locações europeias. 





Nova York está impregnada do estilo que o consagrou, por isso recorreu ao Velho Mundo para transmitir em bons capítulos sua visão particular sobre a arte. Não por acaso, levou Dostoievski para a Inglaterra com o romance Crime e Castigo traduzido no vigoroso e exuberante Match Point (2005). No sincero mas menos atraente Scoop (2006), Allen mostrou que a inspiração não se esgotou com o anterior. Na Espanha, tentou recriar um romance latino em "Vicky, Cristina, Barcelona" (2008), mas o que era para ser o auge da trilogia tornou-se um capítulo fora de lugar, com narração desnecessária, enredo previsível e atores sem conexão - ainda que sejam Penélope Cruz, Scarlett Johansson e Javier Bardem. 

Eis que Allen retoma o diálogo na França, com "Meia Noite em Paris" num tributo à cidade Luz digno de comparação com "Manhattan" (1979). Mais que isso: uma homenagem em tons modernos e surrealistas à arte, que prescinde qualquer divisão. A sensação de que uma época anterior teria sido mais interessante é desmascarada pelo diretor de modo simples e convincente. Incrivelmente, não estão presentes o pessimismo e o absurdo ante o mistério da existência característicos de seus filmes e vemos apenas alguém que prefere apreciar a obra por seu vigor intrínseco, reforçado pelo contato com gente como Ernest Hemingway, Scott Fitzgerald e Pablo Picasso. 





"Meia Noite em Paris" (2011) é um projeto imperdível para quem espera um filme artístico com leveza e um filme divertido mas sem concessões. A cereja do bolo fica por conta das críticas a um certo intelectualismo esnobe, arrogante e falsamente educado, presente em tantos meios que acompanham o meio erudito e tanto atrapalha o acesso à arte e sua compreensão. 




Um Woody Allen de raro humor, que soube se reinventar em território inédito e demostra mais uma vez a força de seu cinema após 45 anos de carreira. 75 de idade e 44 filmes depois, Woody Allen comprova como a maturidade pode aprimorar uma obra e não esgotar o percurso. 

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Se Beber, Não Case I e II

Se Beber, Não Case I (The Hangover I)
Se Beber, Não Case II (The Hangover II)
Direção: Todd Phillips
Elenco: Bradley Cooper, Ed Helms, Zach Galifianakis, Justin Bartha, Ken Jeong
Escrito por (parte I): Jon Lucas, Scott Moore
Escrito por (parte II): Craig Mazin, Scot Armstrong, Todd Phillips
EUA, 2009 e 2011
Notas no IMDb: 7.9 e 6.9




Recentemente, Todd Phillips parece desenvolver a mesma ideia, em situações diferentes, a cada filme. O diretor se envolve em comédias escrachadas e politicamente incorretas, com situações absurdas provocadas pelos personagens ao perder a memória  por causa da bebida; ou mesmo por encarnarem o tipo sem-noção que seria insuportável na vida real. Nem sempre as piadas funcionam, mas provoca risadas em plateias no mundo todo por conta de situações inusitadas. 




Conhecido por comédias como Caindo na Estrada (2000), Starsky & Hutch (2004) e Escola de Idiotas (2006), deu novo rumo ao gênero a partir de Se Beber, não Case (2009). Amigos se reúnem em Las Vegas para a despedida de solteiro de Doug (Justin Bartha). A partir daí, o filme mostra o porre homérico do pós-festa e reconstroi, aos poucos, a noite insana da qual eles pouco lembram. O grupo se depara com algumas situações que os faz relacionar acontecimentos e, aos poucos, se lembrar do que houve sob efeito de bebidas e drogas. 





Na verdade, "Se Beber, não Case" não cumpre o que promete. A edição do trailer é mais engraçada que o próprio longa. A ânsia por criar situações engraçadas em sequência acaba prejudicando a premissa do diretor, apesar de certas situações que valem o filme. A cena do quarto semi-destruído, com  roupas, garrafas, móveis e o que mais existe por ali espalhado, no momento em que Stu (Ed Helms), Phil (Bradley Cooper) e Alan (Zach Galifianakis) descobrem um tigre no banheiro é daquelas que chegam a valer o ingresso do cinema. Mas não passa muito disso. 





A continuação "Se Beber, não Case 2" (2011), motivada pelo sucesso do primeiro, finalmente faz a série valer a pena. Todd domina melhor o desenrolar da narrativa e coloca piadas no lugar certo. Os roteiristas, inclusive, não são os mesmos, o que pode sugerir que os produtores também acharam que o primeiro filme poderia ter cumprido melhor o que prometeu. Com mais ação que o antecessor, as situações em si também são mais engraçadas. Sem contar na figura insana e misteriosa (!) de Alan (Zach Galifianakis). O barbudo sem noção que protagoniza os acontecimentos mais confusos e inesperados, sem o qual os filmes não teriam a mesma graça. 





O sucesso comercial de uma noite em que tudo é permitido reflete os valores de uma sociedade que prefere ignorar certos limites em nome do prazer momentâneo. As consequências não importam tanto quanto a satisfação imediata que o abuso de álcool e outras drogas pode causar. Um filão que o cinema americano descobriu há tempos e que a comédia contemporânea reinventa para conquistar novos adeptos e garantir bilheterias recheadas. Novas versões para  "o que acontece em Vegas, fica em Vegas". 





segunda-feira, 30 de maio de 2011

Um Novo Despertar

Um Novo Despertar (The Beaver)
Direção: Jodie Foster
Elenco: Jodie Foster, Mel Gibson, Anton Yelchin, Jennifer Lawrence, Riley Thomas Stewart
Escrito por: Kyle Killen
EUA, 2011
Nota no IMdB: 7.0




A atriz Jodie Foster mostra autoridade no segundo filme como diretora. "Um Novo Despertar" traz Mel Gibson no papel de Walter Black, um executivo em crise no trabalho e que vê a família desmoronar por não conseguir se comunicar com a mulher e os filhos. Em depressão, passa a usar um fantoche de pelúcia para voltar a ter contato com o mundo e superar traumas. Mais tarde, enfrenta o problema do espaço que esta solução passa a ocupar em sua vida.

Mel Gibson, vencedor do Oscar por "Coração Valente" (1995), tem talvez em "Um Novo Despertar" a atuação mais firme da carreira. Domina e convence no papel, ao tratar sobre a falta de comunicação familiar e sobre problemas comportamentais. Em uma época em que frequenta mais páginas policiais que propriamente as de cinema - acusado de violência doméstica e por dirigir embriagado -, Gibson cumpre a tarefa de levar ao público uma história convincente.




"Mentes que Brilham" (Little Man Tate, 1991), estreia de Foster como diretora, já trazia questões familiares no enredo. Em "Um Novo Despertar" ela alcança um olhar profundo mas bastante leve, ao não apresentar soluções mágicas nem respostas diluídas em sentimentalismos. Roteiro preciso de Kyle Killen para a condução de Foster, que vive ainda Meredith Black, a paciente esposa de Gibson.

O enredo paralelo entre Porter Black (Anton Yelchin), filho do casal protagonista, e Norah (Jennifer Lawrence) também dá fôlego à história. Ao tratar ainda da dificuldade de comunicação, mas em outra vertente, os dois tocam em conceitos como inspiração/criação e apresentam um novo trunfo da diretora.




Fracasso de bilheteria nos EUA por influência das denúncias contra Gibson, "Um Novo Despertar" estreou rápido no Brasil após ser exibido fora de competição em Cannes. Uma escolha certeira para quem gosta de dramas sobre transtornos psíquicos e relações familiares.