sábado, 19 de março de 2011

O Grande Desafio (The Great Debaters)

O Grande Desafio (The Great Debaters)
Diretor: Denzel Washington
Elenco: Denzel Washington, Nate Parker, Jurnee Smollett e Denzel Whitaker
Escrito por: Robert Eisele e Jeffey Polo
EUA, 2007
Nota no IMDb: 7.6




Denzel Washington em um drama racial. Desta vez, além de protagonista, como diretor. Em um papel quase oposto ao furioso Malcom X (de Spike Lee, 1992), quando viveu o ativista radical que pregava a violência e a mobilização incansável na luta pelos direitos civis dos negros.

“O Grande Desafio” (The Great Debaters) passou batido em 2007, mas devia ter recebido mais atenção. Chegou ao Brasil direto em DVD, sem exibição nos cinemas. Uma pena. É baseado na história verídica de Melvin Tolston (Washington), poeta e professor do pequeno Wiley College, no Texas dos anos 1930, um barril de pólvora para quem, a despeito da formação cultural, não tinha direitos por causa da cor da pele. Tolston reúne estudantes para a equipe de debates estudantil e utiliza métodos nada convencionais para ensiná-los e cativá-los. Henry Lowe (Nate Parker), Samantha Booke (Jurnee Smollett) e James Farmer Jr. (Denzel Whitaker) são os pupilos prodígios de Tolston numa jornada de expressão das imensas habilidades intelectuais e no descobrimento das próprias fraquezas.




O tema dos debates, mais que sua apresentação, afinal, forma a espinha dorsal do argumento. Questões caras à época são tratadas pelos estudantes e envolvem a defesa/negação de políticas econômicas e culturais, referentes à situação dos negros nos EUA na primeira metade do século 20. A inclusão em Universidades e a igualdade civil são mostradas do ponto de vista de gente comum que não tinha direitos garantidos por lei nem legitimação cultural para tanto, situação irracional que perdurou, em termos legais, até a metade do último século na nação mais influente do planeta.

Mais duas questões que merecem nota: a cena com citações a Gandhi e Thoreau ("A desobediência civil"); e as passagens em que brancos e negros defendem um ponto de vista para o bem comum, alertando que a igualdade de direitos civis não se conquista devolvendo o preconceito justificado pela opressão anterior. 


segunda-feira, 7 de março de 2011

Bruna Surfistinha

Bruna Surfistinha
Diretor: Marcus Baldini
Elenco: Deborah Secco, Cássio Gabus Mendes, Drica Moraes, Critina Lago, Fabiula Nascimento.
Escrito por: José de Carvalho, Homero Olivetto e Antônia Pellegrino.
Nota no IMDb: 6.1





O fim-de-semana de estreia de "Bruna Surfistinha" nos cinemas levou o filme à segunda melhor bilheteria do ano para os primeiros dias em cartaz (considerando também filmes americanos). 400 mil pessoas assistiram ao longa de Marcus Baldini nos três primeiros dias, representando um marco no cinema nacional. Principalmente se for levado em conta que a produção já tem a sétima melhor bilheteria da Retomada do cinema brasileiro (a partir do fim dos anos 90), mesmo sem a chancela da Globo Filmes. Talvez uma das únicas bilheterias de sucesso sem o apoio de mídia da Globo Filmes, que costuma garantir o sucesso de muitas produções. 

À parte questões empresariais, se você já conhece a história de Raquel Pacheco, menina de classe média que larga a vida na casa dos pais para ganhar dinheiro como garota de programa, não vai se surpreender muito com o filme. Principalmente se já tiver lido o "Doce Veneno do Escorpião", livro biográfico escrito pela protagonista em 2005,  com o jornalista Jorge Tarquini, no qual detalha razões para suas escolhas e o contato com diversos clientes. Está tudo ali: a indiferença com a família adotiva - principalmente com o pai e o irmão -, a falta de amigos e de interesse na escola - e conflitos nos primeiros contatos com a sexualidade -, a decisão de virar garota de programa durante uma busca por emprego e a dificuldade para se habituar à profissão. 



Deborah Secco, no papel de Bruna, nome adotado por Raquel - que mais tarde ganharia a outra alcunha por ser a Bruna, "aquela que parece uma surfistinha", manda no filme. Todas as atenções estão voltadas para ela o tempo todo, e a atriz se sente bastante à vontade com isto. Mesmo em cenas constantes de nudez e sexo, a Deborah demonstra confiança e segurança para conduzir o papel. Até em cenas mais fortes, quando a garota exagera nas drogas, Deborah sabe transitar neste universo e não deixa o ritmo do filme cair. Atuação muito firme. 

O objetivo é o mesmo de qualquer garota que se prostitui – ganhar dinheiro. Mas, por nunca ter passado fome, por ter sido garota de classe média a abandonar o conforto da casa dos pais para fazer programas, há um interesse das outras mulheres por entender os motivos de Bruna e uma vontade de clientes por conhecê-la. Com a fama que conquista no meio, faz um blog que vira febre na internet. Ao comentar a atuação dos homens e expor seus pensamentos, revela que uma garota de programa, afinal, tem expressões próprias e sabe, também, ouvir quem a paga. Boa parte dos que a procuram só querem atenção: não só sexual, mas como fuga da vida que levam.



Para quem pensa em Bruna Surfistinha como um caso limite, de uma garota que largou tudo para viver de sexo por prazer ao que fazia, o filme desmascara essa visão. Ela está lá por dinheiro. Claro que teria oportunidades na vida que suas colegas mais pobres nem sonhariam, mas a expectativa por ganhar dinheiro rápido a fez tomar tal decisão. E mantê-la a qualquer custo. As garotas com quem convivia faziam questão de dizer que, à parte os motivos que as levaram para a prostituição, teriam outras profissões logo que pudessem largar a sobrevivência pelo sexo. A decadência de Bruna acompanha a trajetória com as drogas, em especial, a cocaína. Todo o dinheiro ganho se esvai com dividas em compras luxuosas e com o pó, numa realidade bem conhecida nos grandes centros.

A degradação moral é escancarada em cada cena – não no sentido moralista da questão, mas na exposição a condições adversas e à perda da intimidade a que mulheres se sujeitam em busca de um sustento – mas não é explorada pela personagem. Tudo é tratado com bastante naturalidade, mesmo em momentos críticos que gerariam questionamentos sobre suas escolhas. A visão do filme – condizente com a do livro - não carrega este conflito; sua decisão já foi feita e Bruna deveria ir até o fim. Ou até quando quisesse parar, abandonar o personagem e começar uma nova vida, uma nova Raquel, anos depois. Todo mundo sabe que isso foi feito e, a obra conta, em parte, quais caminhos ela traçou.